Saúde

Quando aquele que cura é o mesmo que fere

O depoimento da colega Marina Vahle, psicóloga do Serviço de Saúde Ocupacional e Qualidade de Vida no Trabalho.

 A Gordo-fobia está presente também nas condutas dos profissionais de saúde. Quando ela ocorre, prejudica a relação de confiança entre médico e paciente, o que pode retardar diagnósticos importantes.

“Eu estava numa consulta com a ginecologista, no ano passado. Meus exames laboratoriais estavam ótimos. Ela perguntou sobre meu nível de atividade física e alimentação e eu falei que ia para academia cinco vezes por semana, que não fazia dieta, mas tentava basear minha alimentação em comidas mais caseiras, conforme orientação da minha nutricionista. Mas a médica contestava, como se o meu peso não fosse compatível ao que eu estava relatando. É péssima a sensação de as pessoas te olharem como uma impostora. Como se ter sobrepeso ou obesidade te tornasse automaticamente doente, ainda que todos meus exames indicassem uma saúde excelente.  

Mas até aí, “tudo bem”. Depois fomos ao exame físico. Na maca, ela estava apalpando as mamas quando disse: “você tem o rosto tão bonito, só precisava ser mais magra”. Eu fiquei sem reação! E olha que eu tenho umas 500 respostas na minha cabeça para esse tipo de comentário, mas na hora paralisei. Eu estava literalmente desnuda naquela maca, e aquele comentário, naquele momento de fragilidade, com a pessoa tocando o corpo, parece que foi ainda pior. Foi um desrespeito ao meu corpo e à minha história. Parece que, naquele momento, todos os anos de terapia e aceitação do corpo foram para o ralo. A raiva que senti, e ainda sinto, é absurda. Por que um profissional de saúde deveria opinar sobre a minha beleza?  

Nunca mais voltei lá. E sabe o que é interessante? A própria médica era gorda. Depois eu entendi que a ofensa dela para mim era, na verdade, uma projeção das frustrações dela mesma. Isso me ajudou um pouco. Mas o que mais me ajuda é canalizar isso para campanhas como essa que estamos fazendo”.

Gordofobia médica

Marina não foi a única a sofrer esse tipo de preconceito. Em abril deste ano, a ex-dançarina da cantora Anitta, Thais Carla, repercutiu na mídia a gordofobia que sofreu no parto de suas duas filhas por parte da equipe médica. Em entrevista, Thais relatou que os médicos não queriam atendê-la, falavam sobre seu peso, consideravam a gravidez de risco, pediam para ela repetir exames que já tinham dado bons resultados e exageravam nos remédios. Ao se expor, ela sofreu ainda mais ataques gordofóbicos nas redes sociais, inclusive de uma enfermeira.

Patricia Abrantes, assistente social do SesoQVT, lembra que a hashtag #gordofobiamédica nas redes sociais reúne muitos outros relatos desse preconceito que, infelizmente, é bastante comum.

— Temas que tratam de inclusão não fazem necessariamente parte do currículo ou têm muito espaço para reflexão na formação de médicos e outros profissionais de saúde. O julgamento que as pessoas gordas sofrem por sua aparência faz com que muitas delas evitem consultórios médicos, retardando diagnósticos importantes que poderiam impedir adoecimentos mais graves — alerta.

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